quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Cenas da farsa eleitoral - Debates expõem mentiras, cinismo e hipocrisia

Não basta obrigar o povo a votar, têm que fazê-lo de bobo. Esse é o pacto do monopólio dos meios de comunicação com os candidatos do partido único para a sua aparição nos debates, telejornais e programas eleitorais.

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Falam muito e não dizem nada, pois a regra geral é elevar às alturas o nível da desfaçatez. Assim determinam os marqueteiros, canalhas formados na especialização de enganar as massas, ao impor aos seus contratantes o vestuário, o modo de falar, as caras e bocas para cada situação, além dos temas a serem evitados e os que devem ser repetidos à exaustão para se transformarem em "verdade".

A subserviência como ponto de partida

Como já afirmamos neste espaço os programas dos três candidatos escalados pela imprensa dos monopólios, no caso, Dilma Roussef, José Serra e Marina Silva, embutem um núcleo comum de conteúdo baseado nos compromissos assumidos por Luiz Inácio em 2002 com a famigerada "Carta ao povo brasileiro". Esta revelava toda a subserviência do candidato de então aos desígnios do Fundo Monetário Internacional, do Banco Mundial, da Organização Mundial do Comércio e os demais organismos comandados pela Casa Branca e pelas oligarquias financeiras internacionais.
Ora, se no atacado há uma extrema convergência, fica então uma margem muito estreita para a diferenciação entre as propostas, ou seja, a fala de cada um tem sempre que afirmar, direta ou subliminarmente, o compromisso com o imperialismo, com a grande burguesia e com o latifúndio de velho e novo tipo. Resta, então, buscar esta diferenciação no varejo. É aí que vem o grande esforço de cada candidato de mentir mais e ser mais cínico do que o outro no papel de fazer o povo de bobo, contando para isso com o processo de entorpecimento e alienação das massas , já levado a efeito pela programação, principalmente televisiva, sistematicamente imposta pelos monopólios de comunicação.

Saúde, educação, segurança, meio ambiente, blá,blá,blá...

Como os recursos arrecadados do povo pelo apodrecido Estado brasileiro destinam-se a nutrir o imperialismo e o que sobra é distribuído com as classes dominantes lacaias e com os oportunistas de plantão no gerenciamento do velho Estado, logicamente não sobra recursos para garantir às massas o mínimo possível em termos de suas necessidades mais prementes, como a terra, o emprego, a saúde e a educação, gerando, assim, esse quadro de instabilidade social do qual a delinquência e a criminalidade são o efeito e não a causa, mas que as classes médias, principalmente, têm em alta conta.
Este é o caldo de cultura para a proliferação de toda a sorte de demagogia, falsas promessas e hipocrisia. Prometer construir cinco mil postos de saúde, dez mil escolas técnicas, vinte mil creches, mil clínicas para recuperação de drogados, mais mil disto, três mil daquilo e outras promessas por quilo ou tonelada.
Esta é a lógica dos marqueteiros para ludibriar as massas: partir de suas necessidades básicas para, usando um formato novelístico, onde pessoas do povo são usadas como atores, passar para a sociedade a ilusão de que este problema já está sendo resolvido por sua facção e será atacado  definitivamente caso o povo destine o seu voto ao hipócrita que lhes fala. Enquanto Dilma Roussef diz que o presidente Lula já fez isso, José Serra fala que em São Paulo seu governo fez aquilo, Marina Silva afirma que no Acre tal coisa está dando certo há anos e, portanto, caso eleitos estenderão para todo o Brasil essas "fabulosas" experiências. Esta é também a lógica dos aproveitadores: criar vitrines para vender a ilusão às massas de que um dia cada indivíduo terá chegada a sua vez.
Não é de Cardoso nem de Luiz Inácio a autoria dos programas de focalização como Bolsa Família, Prouni, Minha Casa Minha Vida. Todos eles são do receituário de "políticas compensatórias" do Banco Mundial e para surtirem o efeito da ilusão nas massas precisam ser acompanhados de uma massiva carga de propaganda. Não é à toa, portanto, que no período pré-eleitoral vultosas somas de dinheiro foram gastas pelas frações do partido único.

Mas o povo não é bobo

A tremenda pressão exercida sobre as massas para levá-la ao voto, inclusive, a propaganda do órgão responsável pela realização da eleição, se por um lado ainda consegue enquadrar uma razoável parcela do eleitorado, por outro é expressiva a parcela que rechaça o processo eleitoral farsante. E ela é cada vez mais crescente, não se deixando levar pela chantagem que as classes dominantes fazem para ter seus quadros "democraticamente" eleitos e "legitimamente" dar continuidade à exploração e opressão da imensa maioria do povo por mais quatro anos. A iniciar pela juventude, que mesmo tendo o "direito" de voto aos dezesseis anos, recusa-se a comparecer ao Cartório Eleitoral para tirar o Título de Eleitor, passando pela organização de comitês contra a farsa eleitoral. Estes comitês se alastram por todo o país, tanto nas cidades quanto no campo, constituindo-se num movimento de significativa importância pelo fato de revelar uma elevação da consciência das massas sobre o caráter das eleições burguesas e a busca da verdadeira saída para uma transformação de profundidade da realidade brasileira.

O boicote ativo é o fato novo desta eleição

Em todas as eleições realizadas anteriormente, uma parcela do eleitorado protestou não comparecendo às urnas ou comparecendo e anulando seu voto ou, ainda, votando em branco. O surgimento dos comitês de luta contra a farsa eleitoral, concitando as massas a não só boicotarem as eleições, mas a iniciarem a preparação da revolução como a única via de efetivar uma verdadeira transformação no país, é o que podemos chamar de fato novo no cenário político brasileiro.
As consignas de "Abaixo a farsa eleitoral", "Não vote, organize-se e lute", "Eleição Não, Revolução Sim" e mesmo de "Voto nulo" surgidas ao longo dos últimos anos e já vistas pelos muros de todo o país, circulando em panfletos e convocatórias de reuniões dos comitês, revelam que, diferentemente dos protestos individuais e dispersos, inicia-se um processo que demonstra não só uma elevação do nível de politização como também de organização.
E, mesmo levando-se em consideração que ainda não é um movimento massivo, isto deve ser enaltecido como um avanço na compreensão de que através de eleições sob o domínio das classes reacionárias a única coisa que podemos esperar é a reprodução da velha política da velha democracia burguesa corrupta desde a medula e que só através da revolução pode-se marchar para uma democracia nova, na qual, ao invés do predomínio das classes reacionárias, a hegemonia seja dos setores populares nucleados pela aliança operário-camponesa.
Somente uma República Popular, saída de um processo revolucionário, poderá efetivamente corresponder aos verdadeiros anseios democráticos de terra, emprego, saúde, educação e justiça. Fora disso, são as mentiras, o cinismo e a hipocrisia imperante.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

A Cidade das Mulheres

Lázaro Faria

SINOPSE

O filme Cidade das Mulheres é uma resposta à Ruth Landes, antropóloga norte-americana que, no ano de 1939, esteve na Bahia pesquisando a raça negra e se surpreendeu com a força e a soberania que as mulheres do candomblé exerciam numa organização matriarcal. Seu pensamento será um dos fios condutores deste documentário, ilustrado por imagens das festas populares e dos cultos afr...icanos, das famosas mães de santo e da beleza exuberante da cidade de Salvador.

Cidade das Mulheres apresenta Mãe Estela, Yalorixá do terreiro Axé Opó Afonjá – um dos mais antigos e conceituados da Bahia, que vai contar a história do candomblé e a história da sua própria vida. Num belíssimo depoimento, mostrando o quanto está à frente do seu tempo, Mãe Estela discute o matriarcado, a força das mulheres e o sincretismo no Brasil. Por fim, ela fala do futuro e da esperança que tem na continuidade e na força do candomblé.

Permeando o pensamento de Mãe Estela estarão antropólogas, sociólogas, teólogas, mães de santo, comerciantes, enfim, as baianas, que irão enriquecer e fundamentar o seu discurso. O documentário vai mostrar a mulher do povo, a baiana do acarajé, a baiana comerciante da feira, a baiana empresária, como é sua vida e o que é ser baiana nos dias de hoje.

O documentário Cidade das Mulheres faz um panorama da identidade visual e cultural dessas baianas que, através das gerações, criaram um mito, deusas que atuam e interferem no quotidiano da cidade. Um símbolo de resistência, dignidade e, sobretudo, beleza.

JUSTIFICATIVA

No final dos anos trinta, a antropóloga Ruth Landes chegou ao Brasil, com a intenção de estudar as relações raciais no Brasil. Ao tentar comparar o racismo no Brasil e nos Estados Unidos ela se deparou com duas realidades diferentes, porém não menos exclusivistas. Os negros no Brasil não eram discriminados somente pela cor da pele, eles eram mantidos na ignorância e na miséria. Aos pobres restava a religião, o candomblé, que naquela época era proibido e perseguido.

Ao voltar para os Estados Unidos, discretamente expulsa do país por seus estudos sobre o candomblé, Ruth Landes lança o livro “Cidade das Mulheres”. Ela relata com clareza e com certo espanto, a força da baiana, essa mulher que inventou no Brasil um sistema matriarcal inédito, desenvolvido em torno do culto aos orixás, onde o poder é da mãe. Através das obrigações com os santos as mulheres foram para os mercados, tomaram as ruas com suas comidas e seus trajes exóticos, o que possibilitou sua liberdade econômica.

Cidade das Mulheres vem homenagear a força dessa mulher através de Mãe Estela, Yalorixá do terreiro Axé Opó Afonjá, símbolo maior de dignidade e doação, uma vida dedicada ao seu povo. Sua história, sua filosofia e seu legado estarão preservados através dos seus depoimentos. O principal objetivo deste documentário é mostrar o poder dessas mulheres, confirmar o matriarcado baiano com a afirmação de que a Bahia é a Cidade das Mulheres.

Título: A CIDADE DAS MULHERES
(ATLANTA PREMER)
Gênero: Documentário
Cidade e Ano: Brasil, 2005 
72 minutos
Diretor:Lázaro Faria
Produtores:
Cleo Martins
Direção de Fotografia: Lázaro Faria
Edição: Isabella Lago
Música:Cleo Martins

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Hip Hop Lutarmada e as Eleições...

Galhardetes, baners, faixas, carros de som, panfletagem profissional, promessas, mentiras, acusações e bravatas. De 2 em 2 anos somos submetidos autoritariamente a esse martírio. A propaganda oficial diz sobre o seu Direito ao voto. De acordo com Marilena Chauí “a função do Direito é fazer com que a dominação não pareça uma violência. Se o Estado e o Direito fossem percebidos como instrumentos de dominação, os dominados se revoltariam”.  E hoje o que fazem os partidos, inclusive os de esquerda? Se valem desse Direito ao voto para disputar espaço no Estado. E reparem que no caso das eleições, sob as cortinas do Direito se esconde uma obrigação. Se a pessoa com idade eleitoral resolve não votar, ela estará obrigada a uma multa ou será submetida a punições que trarão transtornos à sua vida social e pessoal. Ou seja, o que se propagandeia como um direito seu, na verdade é uma imposição.
As candidaturas de esquerda muitas vezes são justificadas com o argumento de que o Estado é um fato que independe da nossa aprovação como militantes, e que por isso devemos ocupar esses espaços com nossos representantes para serem um contra-ponto aos políticos de direita. Começamos aqui denunciando a possível ingenuidade que há em acreditar nisso. Para quem concorda que O Estado é o comitê executivo da burguesia, é um tanto quanto equivocado levar a nossa luta para um campo onde a burguesia tem mais força. Pela experiência acumulada nesses dinâmicos anos de “democracia”, percebemos que “nossos representantes” não ocupam espaços no aparato do Estado. Eles são, sim, consumidos, tragados, abduzidos pelo Estado.
Se os partidos surgem como forma de organizar o povo para a luta, esse propósito se desvirtuou com o tempo. Hoje, em função das eleições, os partidos não só abdicam da organização da luta popular, como desorganizam algumas iniciativas em construção. Em primeiro lugar ninguém seria leviano em negar que em período de eleição não há luta, a não ser por votos. Toda a esquerda, inclusive a que não é cúmplice disso, é pautada pelo processo eleitoral (vide o atual insucesso do Plebiscito Popular Pelo Limite da Propriedade de Terra, pro qual já se sabe, teve uma participação bem inferior aos plebiscitos anteriores ). Numa segunda análise nota-se que algumas organizações passam um período de 1 ano e meio em suas bases num trabalho de formação sob um alerta de Karl Marx de que “A emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores”. Até que a campanha eleitoral começa e boa parte da esquerda atravessa o nosso caminho dizendo que “o seu voto pode fazer a diferença”.
Com tanta gente falando sobre o voto como caminho para o progresso, a justiça social e a paz, e como a defesa do processo eleitoral está presente tanto no discurso da direita como no da maioria esmagadora da esquerda, como o grito de “vote” ecoa bem mais e em maior volume do que o grito de “lute”, por fim as bases se convencem de que a emancipação dos trabalhadores será obra... do “meu representante” no congresso, na assembléia, na câmara municipal, e no palácio do governo. Só que como a máquina de propaganda (e compra de votos) da direita é infinitamente mais forte do que a da esquerda, a grande maioria dessas pessoas convencidas a votar, votam em conditat@s de partidos conservadores. Isso fica difícil de ser enxergado por uma esquerda distante das “comunidades baixa-renda”. Porém, mesmo de longe isso pode ser constatado quando se observa que quase a totalidade de moradores dessas comunidades que se candidatam, o fazem por partidos de direita. Esse é o resultado do desserviço prestado pela esquerda partidária, que legitima a perpetuação de nossos inimigos no poder.
Numa das primeiras paginas da tão comemorada constituição de 1988, consta que “todo poder emana do povo (...)”, mas, por exemplo, na esfera federal, 15,5 bilhões do nosso dinheiro foram gastos saldando a dívida do Estado brasileiro com o FMI; no Estado do rio, com um déficit de aproximadamente 10 mil professor@s, o governo gasta R$ 45 milhões com carros e helicópteros blindados para a sua polícia, em maior segurança, atirar em cabeça de pobre; no Rio, a prefeitura proibiu a utilização de escolas municipais para a realização de cursos pré-vestibulares comunitários. Cursos esses que capacitaram muit@s jovens de periferia a prestar, com sucesso, um vestibular que nem deveria existir. Se o poder de fato emana do povo e se o povo é diretamente afetado com tais medidas, por que o povo não pode debater e decidir?
Alguns militantes de partidos de esquerda dizem que o voto nulo, hoje, no Brasil é despolitizado. Podemos até concordar com isso, mas a mesma coisa pode se afirmar sobre o voto válido: sua esmagadora maioria se baseia em critérios os mais variados e absurdos que não o histórico, a orientação e plataforma política de cada candidat@. Para ilustrar tal fato basta ver a projeção de votos para o candidato a deputado em São Paulo, Tiririca, cujo slogan é “Vote no Tiririca. Pior do que tá não fica”. E esse processo de deseducação política do nosso povo tem enorme colaboração dessa esquerda que promove campanhas como “Fora Sarney”, “Fora Arruda” e outras semelhantes, atacando um sintoma da nossa sociedade e não a sua estrutura. Por que? Seria por que não é interesse implodir uma estrutura da qual querem se beneficiar? Em artigo publicado em junho deste ano
 ( http://metamorfozesnacidade.blogspot.com/2010/06/uma-outra-politica-e-possivel.html), o sociólogo Antonio Ozai dá a sua opinião sobre essa questão: “cada vez mais aumenta o número dos que passam a viver da política. A missão revolucionária, viver para a política, é sutilmente substituída pela dependência econômica em relação ao aparato burocrático do partido e do Estado”.
Para @ polític@ honesto da esquerda que quiser de fato combater a corrupção na nossa política, o primeiro passo deveria ser não emprestar a credibilidade de seu nome a um jogo que permite a ascessão ao poder de figuras como Collor, Sarney, Maluf, Arruda, Álvaro Lins, Celso Pita, José Dirceu e tant@s outr@s.  Também não se sustenta o argumento de que pode se votar no candidato X para impedir que o candidato Y se eleja. A dinâmica da política institucional é muito suja. Os opositores de hoje “num toque de mágica” amanhã se tornam aliados. Um bom exemplo era a polarização entre PP e o PT, principalmente em São Paulo. Essa prática de votar para excluir funcionou até 2003. Quando o PT chega à presidência o PP – que já se chamou PDS, PPR e que tem origem na Aliança Renovadora Nacional (ARENA, partido de sustentação da ditadura de 1964) – se alia ao antigo rival. Como dissemos, o jogo é sujo.
Respeitamos todas as formas do povo organizar a luta contra-hegemônica. E se criticamos a atitude dos partidos que disputam eleições é porque acreditamos que essa não é uma forma de organizar, mas sim, o contrário, ela desorganiza a nossa classe para a luta.
Então, não é só pelo que representa o Estado; não é só pelo impacto negativo que o processo eleitoral tem sobre as organizações populares; não é só por legitimar o poder exercido pelos nossos inimigos de classe; não é só pela corrupção d@s que são eleit@s; não é só pela sangria de militantes das ruas para o aparato burocrático, tanto do Estado quanto dos partidos; não é só pelo fato de esse modelo institucional usurpar o poder que deveria emanar do povo. É por tudo isso junto que nós do Coletivo de Hip Hop LUTARMADA acreditamos que o caminho que nos levará ao socialismo não passa pelas eleições. É por isso que nós defendemos o voto nulo.

Inspirad@s nos Black Panthers,
TODO PODER AO POVO.

Coletivo de Hip Hop LUTARMADA.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Presos políticos mapuche recusam a mesa de diálogo anunciada pelo governo

[Os mapuche rejeitaram ontem [segunda-feira], a mesa de diálogo anunciada pelo governo chileno e afirmaram que não vão parar a greve de fome que já passa de 72 dias.]
"A mesa é apenas uma manobra comunicacional do governo para convencer a opinião pública de que está disposto a conversar", disse a uma rádio local Rodrigo Curipán, porta-voz dos grevistas encarcerados na cidade de Angol. Os familiares dos 34 mapuche em greve de fome também se juntaram às críticas contra La Moneda [sede da Presidência da República do Chile]. "A oferta do governo não resolve nada", disparou Natividad Llanquileo, porta-voz dos presos que mantém o jejum na prisão de Concepcion. "O governo não nos convidou e, além disso, não estamos interessados, o que nos interessa é resolver a greve. Nós acreditamos que eles (o Executivo) estão brincando com a vida dos comuneros", acrescentou. "Eles vão definir a sua mesa de diálogo que não representa ninguém além de si mesmos. Além disso, eles estão interessados em confundir a opinião pública", reclamou Llanquileo.
Por seu lado, Eric Millán, porta-voz das famílias dos presos mapuche em Temuco, informou que o governo de Piñera tenta mostrar que o problema será resolvido. "Não temos recebido nenhuma chamada, por isso não vamos sentar à mesa", disse o porta-voz. Millán anunciou que o protesto vai continuar até as últimas conseqüências, se não houver a retirada das acusações contra os comuneros pelo cometimento de atos terroristas.
Durante as celebrações do bicentenário, o presidente chileno anunciou um diálogo amplo com as comunidades mapuche, que começaria hoje na cidade de Temuco. A promessa foi conversar e ouvir as reivindicações históricas dos povos indígenas em relação à posse da terra, cultura e integração social. No entanto, a oferta do presidente não inclui as organizações indígenas mais radicais ou representantes dos reclusos que estão em greve de fome há quase três meses. Os presos mapuche se consideram presos políticos e exigem que não lhes sejam aplicadas a chamada Lei Antiterrorista. Esse instrumento jurídico data da ditadura de Pinochet (1973-1990) e permite o duplo processamento nos tribunais civis e militares. 

O crescimento da xenofobia na Europa

O primeiro ministro italiano, Silvio Berlusconi, mostrou seu apoio ao presidente francês, Nicolas Sarkozy, em sua política de deportações de romenos e búlgaros de origem cigana. Durante uma reunião com senadores, Sarkozy manifestou que “não haveria nenhum” problema se os luxemburgueses quisessem acolher os ciganos. O presidente respondia assim às críticas da comissária de Justiça, Viviane Reding, que é de Luxemburgo, e que comparou as deportações com os fatos ocorridos durante a Segunda Guerra Mundial. Um alto funcionários dos Estados Unidos disse que “é preciso convidar a França e outros países a respeitar os direitos dos romenos”.
O primeiro ministro italiano, Silvio Berlusconi, mostrou seu apoio ao presidente francês, Nicolas Sarkozy, em sua política de deportações de romenos e búlgaros de origem cigana. “A senhora Reding”, disse Berlusconi fazendo alusão à Comissária de Justiça da União Européia, faria melhor tratando desse assunto privadamente com os dirigentes franceses, ao invés de publicamente, como tem feito”. Em uma entrevista exclusiva concedida ao jornal francês Le Figaro, Berlusconi manifestou que “a convergência ítalo-francesa ajudará a agitar a Europa e a resolver os problemas com políticas comuns”.

As palavras de Berlusconi atiçam uma controvérsia que segue quente apesar de o governo francês ter pedido a Bruxelas calma e diálogo frente a uma possível sanção pela expulsão ilegal de romenos de origem cigana. Durante uma reunião com senadores, Sarkozy manifestou que “não haveria nenhum” problema se os luxemburgueses quisessem acolher os ciganos. O presidente respondia assim às críticas da comissária de Justiça, Viviane Reding, que é de Luxemburgo, que comparou as deportações com os fatos ocorridos durante a Segunda Guerra Mundial e depois foi obrigada a se retratar dizendo ter sido mal interpretada. Um alto funcionários dos Estados Unidos disse que “é preciso convidar a França e outros países a respeitar os direitos dos romenos”. A chanceler alemã Ângela Merkel criticou o tom e as declarações de Reding, qualificando-as como “não apropriadas”.

O porta-voz em Bruxelas da Liga Norte, partido xenófobo aliado do governo italiano, foi mais longe que Berlusconi. “Quantos romenos Luxemburgo vai acolher?” – perguntou Mario Borghezio. “Convido a senhora Reding a confirmar ou desmentir se em seu país há campos nômades graças ao endurecimento das normas de expulsão de 2008”, declarou o porta-voz.

A União Européia ainda não entendeu

“O problema com os romenos não é um problema especificamente francês”, disse Berlusconi na entrevista ao Le Figaro. “Concerne a todos os países da Europa. É preciso incluir esse assunto na ordem do dia do Conselho de Chefes de Estado e de Governo para que discutam juntos e encontrem uma posição comum”, afirmou o primeiro ministro italiano. Além disso, Berlusconi assinalou que a União Européia ainda não entendeu que o problema com os romenos e com a “imigração clandestina” não é só “francês, italiano, grego ou espanhol”.

O governo de Silvio Berlusconi empreendeu sua cruzada contra os ciganos em abril de 2008. Assim que tomou posse do cargo, o ministro do Interior, Roberto Maroni (da Liga Norte), proclamou que sua prioridade seria devolver aos cidadãos a segurança perdida sob o governo de centro-esquerda. Entre apelos para expulsar do país as “hordas de bárbaros”, o gabinete aprovou o Pacote de Segurança, um projeto que associava imigração com delinqüência e previa diversas medidas contra os 150 mil romenos que teoricamente estavam morando no país: fechamento de fronteiras e bloqueio do Tratado de Schengen contra os ciganos romenos, destruição dos acampamentos ilegais de romenos com prisões e deportações, e criação de cargos especiais para lidar com a “emergência” cigana em Nápoli, Roma e Milão.

Enquanto a lei era aprovada, houve um programa organizada pela Camorra em Ponticelli (Nápoli) e o Ministério do Interior realizou um censo dos nômades que viviam no país, utilizando fichas com a raça e a origem, incluindo aí crianças. Ambas as coisas levaram muitos romenos a sair do país por seus próprios meios. As recorrentes condenações da ONU, do Parlamento Europeu e da Comissão Européia chegaram tarde. Milão e Roma seguem ainda hoje destruindo acampamentos, mas só restam os ciganos para desalojar.

França tenta baixar a tensão

O conflito entre a Comissão Européia, personificada na figura da comissária da Justiça, Viviane Reding, e o governo francês, obrigou o presidente da França, Nicolas Sarkozy, a pedir calma e um cessar fogo. As duras críticas de Reding contra o que considera equívocos franceses e contra a política de expulsões de ciganos romenos e búlgaros (evocando inclusive a Segunda Guerra Mundial) irritaram o governo francês. Tanto o ministro da Imigração, Eric Besson, como o secretário de Estado para Assuntos Europeus, Pierre Lellouche, muito irritados, qualificaram de “escorregão” as declarações da comissária. O governo francês foi obrigado a fazer uma mediação e emitiu nesta quarta pela manhã um comunicado no qual critica a intervenção “não usual” de Reding, mas chama para “um diálogo tranquilo sobre o pano de fundo do problema”.

Mas pouco depois, durante um encontro com senadores da União por um Movimento Popular (UMP), Nicolas Sarkozy, segundo relato de várias pessoas presentes, insinuou que se Reding não estava de acordo com sua maneira de tratar os ciganos romenos que os acolhesse em Luxemburgo, país de origem da comissária. “O presidente disse que só estamos aplicando o regulamento europeu e as leis francesas e que não há nada a reprovar em nossa política, mas que se os luxemburgueses quiserem acolhê-los podem fazê-lo sem nenhum problema”, disse na saída da reunião o senador da região de Haute-Marne, Brudo Sido, para a agência France Press.

O comentário de Sarkozy chega logo após vários ministros e líderes políticos franceses, além do próprio governo por meio de seu comunicado, terem qualificado de “inaceitável”, de “escorregão” e de “escandaloso” a comparação feita por Reding das expulsões de ciganos romenos na França com fatos ocorridos na Segunda Guerra Mundial. Lellouche assegurou que essa frase de Reding “é muito grave, porque a França sofreu uma ocupação”. Depois acrescentou que o que busca agora, sobretudo, “é acabar com essa polêmica estéril e começar a trabalhar por essa minoria”. Agora, essa minoria deve regressar e ficar na Romênia. “Cada Estado deve ser responsável por sua população”. Lellouche recordou que o desmantelamento de acampamentos de ciganos romenos “não começou neste verão”, mas foi nas últimas semanas que se intensificou o ritmo de deportações e que, além disso, “acabou-se com a hipocrisia”. Ele acrescentou, referindo-se aos outros países europeus: “Quando deixarem de atacar a França, que olhem para o seu próprio jardim”.

Um pouco mais calmo, Besson também qualificou de “escorregão” a intervenção da comissária, que anunciou que pensa em propor ao presidente da Comissão a abertura de um processo de punição contra a França por uma aplicação discriminatória da diretriz de livre circulação de pessoas – os ciganos romenos e búlgaros são cidadãos da União Européia. Não obstante, anunciou que a França vai dar explicações a Bruxelas sobre a famosa circular de 5 de agosto, que esgotou a paciência de Reding. Nesta circular, o governo instrui a polícia para que desmantele os acampamentos ilegais “tomando como prioridade os dos ciganos romenos”, o que prova, para Reding, discriminação racial por um lado e equívocos do Executivo francês por outro, já que Besson e Lellouche deram garantias à própria comissária de que as expulsões estavam ocorrendo caso a caso, sem atender a critérios de raça ou nacionalidade. “Viviane Redin escreveu-me ontem para pedir explicações sobre a circular. Vamos responder e dar-lhe explicações”, disse Besson.

As explicações, basicamente, consistem em que dita circular já foi emendada, eliminando a referência aos ciganos romenos. Assim falou o secretário de Estado da habitação, Benoist Apparu. “Não dissimulamos nem mentimos. A circular existia e foi corrigida. Ponto. Acabou”.

Diálogo acabou
O fato é que o cruzamento de declarações fez a França reagir, buscando, sem êxito até aqui, que o assunto não siga adiante. Após a reunião do Conselho de Ministros, um porta-voz do governo tentou acalmar os ânimos: “Não se trata de polemizar, nem com a Comissão nem com o Parlamento.Não obstante, certas declarações simplesmente não são aceitáveis”. Recordando anteriores intervenções “moderadas” do presidente da Comissão, José Manuel Durão Barroso, sobre o assunto, o governo francês atribuiu as palavras de Reding à famosa circular de 5 de agosto, “que foi substituída pela do dia 13 de setembro”.

É hora de um diálogo tranqüilo sobre o pano de fundo desse assunto. Há vontade de tratar as coisas a fundo e não deixar-se embarcar em uma polêmica estéril, declarou uma fonte da presidência que deixou escapar que o presidente francês, Nicolas Sarcozy, poderia entrevistar-se sobre o assunto com o presidente romeno, Traian Basescu, na próxima reunião do Conselho Europeu, que ocorrerá esta semana em Bruxelas.

Tradução: Katarina Peixoto

terça-feira, 14 de setembro de 2010

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Vênus negra, o racismo de ontem e de hoje

O francês Abdellatif Kechiche narra história verídica e terrível que se passa no século 19, mas se mantém atual

Com Vênus Negra, o francês (nascido na Tunísia) Abdellatif Kechiche conta uma história pavorosa. Na Europa do século 19, a africana Saartjie (Yahima Torres) era exibida como curiosidade de feira, a Vênus Hotentote, mulher gorila, uma fera em forma feminina. Passou por Londres e fez sucesso nos salões parisienses, saindo de uma jaula, com uma corrente presa ao pescoço, dançando e, no fim, sendo tocada pelos incrédulos espectadores. Seu empresário recebeu uma nota alta do Museu do Homem para que ela se submetesse a um exame físico. Só que ela se recusou a mostrar uma parte íntima. Quando morreu em Paris, depois de decair e se tornar prostituta, Saartjie foi parar no mesmo museu. Os cientistas dissecaram o corpo, devassaram seus mistérios, construíram uma estátua de gesso e conservaram esqueleto e órgãos. Em 2002, o governo da África do Sul recupera os restos mortais de Saartjie, que hoje lá estão enterrados. A história pode ser horripilante, mas é significativa.
"E, infelizmente, muito atual", confessa Kechiche. Ele acha que esse caso exemplar de racismo, endossado na Europa do século 19 tanto pela ciência como pelo senso comum, ainda persiste no presente. Ele se refere à depuração empreendida na França de Nicolas Sarkozy, que pretende expulsar ciganos do seu território. A intolerância racial pode ser a referência mais forte de Vênus Negra. Mas o par espetáculo-voyeurismo joga papel fundamental na construção do filme. Kechiche trabalha com cenas longas da exibição do corpo de Sarah (assim passou a ser chamada depois de ser batizada) a espectadores ávidos. "O filme é um olhar sobre o olhar do outro sobre esse corpo", diz.
Corpo devastado pela tristeza e pelo modo de vida. A interpretação da cubana Yahima Torres, em seu primeiro papel no cinema, é magnífica. Há quem já fale em prêmio de melhor atriz. Mas houve, também, quem condenasse o diretor pela exibição do corpo de Sarah, em longas sequências em tempo real, como se ele, de alguma forma participasse daquilo que intenta denunciar. Kechiche se defende: "Eu precisava mostrar o esgotamento desse corpo até a sua mutilação final."
De qualquer maneira, a sua forma de trabalhar não é novidade para quem conhece seu filme anterior, O Segredo do Grão, lançado no Brasil - longos planos em tempo real, um trabalho na extensão e na repetição. Pode encantar ou exasperar o espectador, dependendo do ponto de vista.
O outro filme da competição foi Attenberg, da diretora grega Athina Tsangari. Marina é uma jovem de 23 anos, ainda virgem, que vive com o pai, doente terminal de câncer em uma cidade à beira-mar. Marina acha a espécie humana estranha, vê programas sobre vida animal e se relaciona apenas com sua amiga Bella. Não é um grande filme. Mas a leveza de tratamento (e estilo) com que enfrenta temas como sexualidade, morte e desencanto, acabaram por agradar ao público. E também à crítica.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Entrevista com Mumia Abu-Jamal: “Sou um jornalista fora da lei”

[O jornalista Mumia Abu-Jamal continua preso no corredor da morte há quase 30 anos. Em 29 de agosto de 2010, a representante dos Repórteres sem Fronteiras em Washington DC, Clothilde Le Coz, o entrevistou no locutório número 17 da prisão da Pensilvânia, em Waynesburg, Condado de Greene.]
Pergunta > Como jornalista preso, de que tratam suas últimas observações e investigações?
Mumia Abu-Jamal < A população prisional estadunidense é a mais importante no mundo. Este ano, pela primeira vez em 38 anos, se reduziu. Algumas prisões como na Califórnia ou Michigan aceitam menos presos dado que estão super povoadas. Os financiamentos dos Estados são limitados e se libera alguns presos em função da situação econômica. Nos Estados Unidos, as prisões são grandes e o número de presos é imenso.
É impressionante ver quanto dinheiro o governo estadunidense gasta com tudo isto e até que ponto somos invisíveis. Ninguém o sabe. A maioria da população não se interessa pelo tema. Quando ocorre qualquer drama na prisão, alguns jornalistas dizem e acreditam que sabem de quem estão falando. Mas não é fiel a realidade: é puro sensacionalismo. Podem ser encontrados bons artigos, mas não refletem o que ocorre realmente. O que escrevo é o que tenho visto com meus próprios olhos e o que tem me sido dito. É verídico.
Meus artigos falam da realidade. Fundamentalmente, tratam todos do corredor da morte e da prisão. Eu gostaria que não fosse assim. Faz um ano e meio que estão ocorrendo uma série de suicídios entre os condenados a morte. Dei a informação com exclusividade sobre um suicídio porque ocorreu em meu bloco. Mas segue sendo invisível. Necessito escrever. Há milhões de histórias para contar e personagens excepcionais aqui. Entre as que decidi contar, elejo as mais importantes, comovedoras, frágeis… Decido escrevê-las, mas deve-se ter certa responsabilidade quando se conta este tipo de histórias. Espero que possam mudar o curso das coisas para as pessoas das quais eu falo.
Pergunta > Acredita que o fato de ser jornalista tem influenciado o curso de seu caso?
Mumia < Ser “A Voz dos sem voz” influiu de forma considerável. Na realidade, esta expressão foi tirada de um artigo do Philadelphia Inquirer publicado depois de minha detenção em 1981. Quando era adolescente, era um jornalista radical que trabalhava para a edição nacional do jornal dos Black Panthers. O FBI vigiava minhas publicações desde que tinha 14 anos. Ser jornalista foi meu primeiro trabalho. Sou muito mais famoso que outros detidos nos Estados Unidos pelo que escrevo. Se a situação fosse distinta, o tribunal federal de apelações quem sabe não haveria criado uma lei especial que influísse diretamente sobre minha condenação.
A maioria dos homens e das mulheres que se encontram no corredor da morte não são famosos. O fato de que siga escrevendo deve de ser algo que os juízes levaram em consideração e pelo qual mudaram a lei para que não me pudessem julgar novamente. Creio que pensavam: “Tu és um falador, não terás outro julgamento”. Se espera algo mais de um tribunal federal. E agora, por culpa de meu caso, outros doze podem ser prejudicados.
Pergunta > O que pensas da cobertura midiática de seu caso?
Mumia < Um dia li que já não estava no corredor da morte. Enquanto o lia, estava sentado aqui. Não saí nunca deste corredor, nem um segundo. Como sou do mesmo âmbito, muitos jornalistas não queriam cobrir meu caso por medo de que os criticassem. Tinham que se enfrentar das críticas segundo as que haviam sido parciais e às vezes seus redatores chefes os proibiam de cobrir o caso. Desde o princípio do mesmo, aos mais suscetíveis de cobri-lo, foi se proibido de fazê-lo. A maioria dos jornalistas com os que trabalhei já não exercem a profissão. Estes estão aposentados e ninguém os dá a mínima importância. Mas a imprensa teria que ter certa influência neste assunto. Milhões de pessoas viram o que ocorreu na prisão de Abu Ghraib. Seu diretor, que sorria nas fotos que foram publicadas, trabalhava aqui antes de ir para lá.
No corredor da morte, existem indivíduos sem nenhuma qualificação que podem decidir sobre a vida ou a morte de um detido. Por não sei que motivo, tem o poder de decidir a seu bel prazer se alguém come ou não. E ninguém questiona este poder. Há regras informais. Esses indivíduos podem converter a vida de alguém em um inferno com um simples gesto. Quando escolho as histórias que vou contar, não me falta inspiração nunca. Para um escritor, este é um ambiente rico. Não importa o que dizem meus detratores, sou jornalista. Este país seria muito pior sem jornalistas. Mas para muitos deles, sou um jornalista fora da lei. Antes da prisão, quando trabalhava para várias emissoras de rádio, conheci gente que vinha de todas as partes e apesar dos conflitos com alguns redatores chefes, exercia a profissão mais bonita.
Pergunta > O apoio que lhe tem sido dado na Europa é diferente do que tem nos Estados Unidos. Como explicas e acreditas que a mobilização internacional possa seguir te ajudando?
Mumia < Sim, segue sendo útil. No que diz respeito à pena de morte, a mobilização européia pode ter um impacto nos Estados Unidos. Os países estrangeiros, Europa em particular, estão marcados por uma história peculiar quanto a repressão. Sabem mais profundamente eles o que é a prisão. Sabem o que são a prisão, o corredor da morte e os campos de concentração. Nos Estados Unidos, pouca gente viveu esta experiência. Explica como as diferentes culturas aprendem o mundo. Na Europa, a idéia da pena de morte é um anátema.
O 11 de setembro de 2001 mudou muitas coisas nos Estados Unidos. Os opositores ao poder, os que discutiam sua legitimidade já não tem mais importância. Também mudou a imprensa. O que era aceitável chegou a ser inadmissível. Creio que o 11 de setembro modificou as formas de pensar na opinião pública e também os limites de tolerância dos meios de comunicação. Por exemplo, quando estavam ocorrendo os fatos do 11 de setembro em Manhattan e em Washington DC, a prisão fechou durante o dia inteiro aqui, na Pensilvânia. E estávamos totalmente isolados.
Pergunta > Para obter apoio, seria útil ter uma foto sua, atualmente, neste corredor da morte. O que você acha?
Mumia < Ter uma imagem pública só ajuda em parte. A essência de uma imagem é a propaganda. Assim que as fotos não são tão importantes. O que conta é a personalidade. E faço tudo o que posso. Em 1986, as autoridades penitenciarias confiscaram os gravadores dos jornalistas e só podiam ter um papel e uma caneta na mão. Agora que um artigo é o único vetor para lhe dar algum sentido à situação, o seu autor pode convertê-lo em um monstro ou em um modelo.
Pergunta > Se a Corte Suprema aceitar em lhe conceder um novo julgamento, só se revisaria sua pena e não sua condenação. Como imagina o fato de seguir em prisão perpétua se não lhe executarem?
Mumia < Na Pensilvânia, a prisão perpétua é uma execução em fogo lento. Segundo a lei do Estado, existem três graus de assassinatos. O primeiro se castiga com prisão perpétua ou pena de morte. O segundo e o terceiro grau com prisão perpétua. Não se sai daqui. E nesta prisão, temos a taxa de condenação juvenil à prisão perpétua mais elevada dos Estados Unidos. Mas eu gostaria de acrescentar que na Filadélfia, ocorreram dois casos na mesma época que o meu nos quais as pessoas foram julgadas pelo assassinato de um policial. A do primeiro caso foi absolvida. A segunda, ainda que tenha sido gravada com uma câmara de vigilância, não foi condenada a morte.
Pergunta > E como consegue “fugir” deste lugar?
Mumia < Eu escrevi sobre História, uma das minhas paixões. Eu gostaria muito de escrever a respeito de outras coisas. Meus últimos trabalhos tratam da guerra, mas também escrevo sobre cultura e música. Tenho um tempo interior que tento manter através da poesia e da percussão. Poucas coisas podem ser comparadas com o prazer que sinto aprendendo música. É como aprender um novo idioma. E constantemente eu me desafio a escrever em outro idioma! Uma professora de música vem aqui a cada semana e me ensina. Um mundo novo se oferece a mim e agora o conheço um pouco mais. A música é uma das coisas mais bonitas que o ser humano já criou. O melhor de nossas vidas.
• Para apoiar Mumia Abu-Jamal entrar em contato com Law Offices of Robert R. Bryan 2088 Union Street, Suite 4, San Francisco, CA 94123-4117 http://www.MumiaLegalDefense.org ou http://es.rsf.org/petition-mumia-abu-jamal,37071.html

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Presos políticos mapuche em greve de fome: Carta para todos

Estamos presos porque temos razão, sempre a temos tido, e da mesma maneira que temos direito à vida, também temos direito à morte. O direito supremo a decidir conscientemente o que fazer com os nossos corpos neste conflito interminável.
A nossa proposta para vocês...
Peñi, Lamguien; Amigos; Amigas; setores sociais verdadeiramente progressistas; irmãos libertários, trabalhadores e estudantes; Povo anti-sistema e contestatário; homens sinceros e belas mulheres conscientes:
Juntar-se à nossa luta num bloco amplo de participação; procurar nessa luta o fortalecimento de propostas próprias que os identifiquem, utilizar este tempo de protesto para encontrar os amigos de que nos priva o consumismo e o individualismo egoísta; incentivar ao compromisso social para desmascarar estes tiranos que se disfarçam de humildes e que por todos os meios pretendem convencer-nos de que a sua tirania é necessária, atingir as entranhas deste sistema para construir com as nossas próprias mãos o futuro que merecemos. Não desanimem, pois isto muda a qualquer momento, o único que não muda é o inimigo.
A nossa vida vale menos que uma casa, todas as nossas vidas juntas têm menos importância que um caminhão que faz fumaça, o futuro da gente pobre é traçado no Banco Mundial e no FMI. Assim o têm dito os que continuam a zombar de nós ao aumentar a pena de Walter Ramírez em “Três Anos” de pena agravada.
Continuaremos gritando o contrário, absolutamente tudo ao contrário.
A prisão é por agora o nosso espaço de aprendizagem, por isso os incentivamos a melhorar os métodos de luta, a NÃO subestimar o inimigo, a estudar para lutar, vencer o medo e a passividade.
O patronato através de um “alto executivo” da CORPARAUCANIA, Diego Benavente, declarou que “o Capital é covarde”, pois não permanece onde existe conflito social. Nada mais acertado porque para além de covarde o capital é tão Criminal como os seus porta-vozes.
Vejam a total ausência de escrúpulos destes amigos da infâmia já que ao mesmo tempo em que insistem em dizer que estamos “comendo” nesta greve da fome interpõem um recurso “de proteção” para nos obrigarem à alimentação intravenosa. Pondo a descoberto a imoralidade do governo e a cumplicidade de muita gente com o poder desumanizante.
Por outro lado, os agentes da direita não se cansam de repetir que “somos todos iguais perante a lei” que “nada está acima do estado de direito”, que as “instituições funcionam” e todos os outros inúmeros discursos fascistas elaborados para justificar a injustiça sobre o nosso Povo. Bem, concretamente somos 33 prisioneiros Mapuche apresentados a um juiz antes de qualquer investigação e presos sem direito a que se presuma sequer a nossa inocência, embora os assassinos de Lemún e Katrileo nunca tenham conhecido a prisão e nunca para lá irão, pelo contrário andam com as mesmas armas com que têm matado gente pobre.
Nenhum governo tem almejado abordar de forma séria o nosso percurso histórico e a solução mais diplomática sempre tem sido a técnica da enrolação e a militarização do nosso território. Manobras evasivas para manter a situação sem diálogo político são realizadas pelo atual governo, pois a única coisa que faz é comprimir ainda mais uma situação que necessita de descompressão e que, caso não a haja, significará a existência de custos que ambos os lados terão que enfrentar. Com esta ação de dignidade estamos pedindo ao governo para fazer uso da razão, com esta greve de fome - que é uma peça mais nesta “pacificação” nunca acabada (assim como o foram até à bem pouco tempo os “parlamentos” no território Mapuche) - tentamos tingir com um pouco de humanidade um governo e um sistema que não a têm.
Segundo a lei antiterrorista, um dos objetivos do terrorismo é “impor e arrancar resoluções à autoridade”, bem, este é um caso disso. Apliquem com rigor a lei e digam então que esta é uma “greve terrorista”, mas então como chamarão ao fato de terem protegido uma testemunha que confessou ter cometido dois ataques terroristas, e a mantêm em liberdade enquanto mantêm uma grande quantidade de mapuches inocentes presos?
Ao procurar ocultar o caráter da nossa luta e da nossa condição de presos políticos, o que se tem feito é, pelo contrário, mostrar o caráter político das nossas reivindicações já que a lei antiterrorista é uma lei política, de inspiração e motivações explicitamente políticas. Por outro lado o que ridiculariza o governo e o fragiliza ainda mais, perante os seus erros, é que temos sido sempre nós a tomar a iniciativa: a lição a tirar disto é que, ao contrário dos governos que desprezam a vida e a sua própria história, nós estamos nos encarregando dela e a amamos tanto que arriscamos a vida nesta privação voluntária de alimentos.
Em suma, o que sentimos é muita raiva e impotência pelas injustiças deste obsoleto sistema, mas como um preso não é só um número nem uma fábrica de ódio também sentimos muito Amor e carinho pelo nosso povo e por todos os nossos irmãos que decidiram perder o medo. Amor, afeto e ternura pelos nossos filhos dos quais temos saudades, e também por todos os meninos e meninas mapuche, porque com a nossa dor e sacrifício proclamamos a esperança no seu futuro.
Como já afirmamos, a intenção de fundo da nossa mobilização carcerária é contribuir para se atingir a unidade mínima no seio do Povo Mapuche e do seu movimento, mas também queremos incentivar indiretamente à unidade dos chilenos pobres e desprotegidos na sua luta contra o sistema econômico, já que o Estado garante a dos ricos, nosso inimigo comum. Para o nosso povo Mapuche significaria uma unidade necessária e permanente que a longo prazo nos garantisse a defesa dos direitos recuperados neste processo. Atentemos nos orgulhos sectários que nos impedem de concretizar alianças estratégicas e que contribuem para a lógica autoritária de “dividir para governar”.
Estivemos demasiado tempo observando-nos à distância como se fossemos estranhos ou inimigos enquanto o poder fortalecia a dominação. Unidade para lutar. Unidade para vencer. Unidade para redescobrir a nossa força.
O dever moral dos poderosos - que através das sucessivas gerações nos tem vindo a impor estes problemas - é assumir a responsabilidade e resolver isto. Veremos em que medida é efetivo e conseqüente o estafado discurso de amor ao próximo ou como disse um porta-voz dos ricos: “Agosto é o mês da solidariedade”.
Que ninguém se ponha de lado, aqui são todos responsáveis, o Estado, a igreja (que tem erguido as suas capelas sobre sangue mapuche) e os humanitaristas que reinventam cárceres e estratégias de policiamento
Os Presos Políticos Mapuche, a partir do presídio de Temuco, a partir da sua greve da fome, fazemos um apelo para se juntar à luta social nos seus setores, para apoiar o nosso movimento que é a expressão do repúdio pela crueldade do capitalismo e dos seus representantes, pela indolência de tantos que lá para 2014 estarão às portas das nossas casas pedindo-nos o voto. Apelamos, numa convocatória ampla, ao reencontro com os seus irmãos de luta. Chegou a hora.
Irmãos mapuche, Amem-se, reproduzam-se, tenham muitos filhos mapuche, recuperem, lutem e continuem amando-se.
Irmãos winkas pobres e solidários, unam-se, fortaleçam as vossas lutas, golpeiem de todos os lados o poder que os oprime, reclamem o que lhes pertence e conseqüentemente amem-se muito e sejam sementes de gerações de solidariedade.
21 de agosto de 2010
Presos Políticos Mapuche
Cárcere de Temuco
Em greve de fome há 41 dias
Tradução > Liberdade à Solta